domingo, 29 de janeiro de 2017

DA EXPERIÊNCIA À CONSEQUÊNCIA




            Quando nos voltamos para a história, percebemos o quanto a humanidade já fez por afirmar-se e superar-se. Só para citar um exemplo, neste ano comemoraremos 100 anos da revolução Russa; mas podemos comemorar tantas outras datas que, vitoriosas ou não, representam fatos marcantes que obrigaram indivíduos, grupos, movimentos e classes sociais, agirem de acordo com as condições presentes para afirmarem as suas convicções.
            Iniciativas radicais ou não, foram saídas que os sujeitos da história tiveram que formular contando com o que tinham, mas, acima de tudo, baseados nas experiências passadas, buscaram não repetir os equívocos e acrescentar aos acertos as suas próprias invenções.
            É evidente que, quanto mais história se tem para contar, mais as experiências ajudam a refletir. Os dirigentes da revolução Russa de 1917, poucos triunfos tinham a seu favor, muito pelo contrário, a Comuna de Paris, a mais expressiva manifestação socialista, estava a 46 anos apenas de distância e a teoria sobre a transição socialista elaborada por Marx e Engels ainda não tinha sido totalmente assimilada. De lá para cá, temos diversos acontecimentos que nos ajudam a refletir, comparar e ponderar sobre as escolhas a serem feitas diante das dificuldades colocadas que, para quem se propõe a propor mudanças, devem levar ser consideradas.
            De certo modo, podemos considerar que, um pouco antes e depois da Revolução Cubana de 1959, tida como um farol para a América Latina, tivemos três conformações políticas que ensaiaram superações do capitalismo e que foram aniquiladas, transmutadas ou controladas pelas forças da ordem dominante.
            No aspecto das aniquilações podemos considerar que o imperialismo norte-americano, com a ajuda das forças dominantes locais, organizou diversos golpes de Estado e influiu para a destruição das organizações que escolheram a luta armada como forma de luta para impulsionar o processo de transição socialista.
            De outra forma, no bojo das reações populares que forçaram o processo de abertura política, em diversos lugares, escolheu-se o caminho da institucionalidade para, por dentro da ordem, tentar acumular forças e fortalecer o processo da transição para o socialismo. No entanto, no decorrer das disputas houve transmutações de princípios, de métodos e objetivos e, as derrotas vieram acompanhadas com um misto de desmoralização das forças que depuseram as armas ou que simplesmente toparam aliarem-se as classes dominantes em troca de assumir o compromisso de servir à mesma ordem.
            Por último ainda restam alguns redutos de formas organizativas que não cederam aos chamados para a conciliação, mas que se encontram impedidas de crescerem e estão controladas em territórios isolados do centro do poder dominante. Dentre os países cujas forças em tal situação se encontram, destacamos a Colômbia e o México.
            Da segunda tentativa, da transmutação, que buscou enfrentar a dominação dos capitalistas, temos da mesma forma, duas interpretações sobre o papel do Estado. Como primeira referência, podemos citar a experiência brasileira a partir de 2003 até 2016, em que a aliança entre a burguesia e as forças de esquerda, resultou no engrandecimento do Estado, tendo em vista que ele foi a mediação para a implementação de algumas melhorias nas políticas públicas. A Segunda referência ainda ocorre na Venezuela, onde houve um rompimento político com a burguesia e o imperialismo, mas não chegou ao grau da expropriação das forças produtivas; e lá também o Estado foi fortalecido e reafirmado como instrumento de gerenciamento da ordem.
            Diante disso, na medida em que temos a responsabilidade de retomar o destino da transição para o socialismo, é importante considerar as iniciativas adotadas desde a Comuna de Paris, as revoluções: russa, chinesa, vietnamita, cubana e nicaraguense, passando pelas lutas populares de independência na África, e todas as reações realizadas na América Latina.
            No entanto, não basta que olhemos para trás, é importante que nos debrucemos sobre os problemas filosóficos do tempo presente, por exemplo: sobre o que é o trabalho hoje? O que são as classes sociais na atualidade? O que é ser sujeito da história? O que é o partido político? O que é a transição socialista? Pelo menos isso. Seguindo estas questões, aprenderemos a formular outras que ajudam a elaborar o programa que estabelecerá as diretrizes para errarmos cada vez menos.
                         Ademar Bogo. Filósofo, escritor e agricultor. Membro da Academia Teixeirense de Letras.

domingo, 15 de janeiro de 2017

O CAVALO DE NAPOLEÃO


                            
            Há diferentes sentidos para o uso da palavra mesa. “Sentar-se à mesa”, significa, reunir-se em torno dela, para reuniões ou fazer refeições. Mesmo que ela seja incômoda, quando se quer, em forma de retrato, guardar a fisionomia de todos os membros reunidos, aliás ela foi um problema para Leonardo Da Vinci quando se propôs pintar o afresco da Santa Ceia, obrigando-se a colocar os apóstolos em pé, amontoados ao lado do Mestre, que por essa razão, não pôde ficar na ponta da mesma.
            Há, na atualidade, um misto de contestação e de implicância em relação à mesa e a metodologia de ensino. Para certas correntes, inovação e boa educação é aquela em que “flui o diálogo”. Então confundem educação com atos de inovar, dando voz ao educando que é portador de saberes e, portanto, não pode somente ouvir. Nada mal. Já nos diziam os sábios estudiosos do latim que, educo é trazer para fora ou fazer sair o que está dentro. Esse aprendizado os antigos gregos experimentaram com a maiêutica de Sócrates, muito bem retratada no livro Menon de Platão. Ali aparece Sócrates buscando resultados matemáticos com um jovem escravo através de perguntas encadeadas.
            Portanto, a exigência inovadora que certos contestadores das aulas expositivas, dialogadas ou não, de costumeiro uso na tradição escolar, não é tão nova assim. E, certamente não é por maldade de nenhum abnegado professor, ter que expor conteúdos com os quais sistematiza conceitos, ordena os temas e repassa conhecimentos, extraídos de inúmeras leituras. Se os educandos detivessem em todas as disciplinas uma boa iniciação teórica, poderiam aliviar as exposições invertendo-as para diálogos de elevado grau.
            Mas este ainda parece não ser o ponto crucial. Uma aula de 50 minutos é longa para quem ouve e geralmente curta para quem expõe. Imaginando poder inovar metodologicamente e substituir o “monólogo”, o professor experimente uma exposição instrumentalizada lança mão do projetos de imagens e textos e a aula fica ainda mais cansativa. Então organiza seminários propondo que os educandos exponham através de grupos, determinados temas. Melhora? Cada grupo reclama por não ter sido ouvido, porque a apresentação de colegas “não tem profundidade. Resta ainda, dentre outras, a possibilidade de realizar a leitura de um livro ou de textos indicados. Ora, aí o tempo para ler um texto leva mais do que 50 minutos e continuamos no mesmo sistema do aprendizado.
            Sem cultuar as deficiências metodológicas temos algo mais conspirador contra o professor no mundo universitário que do ponto de vista político tentou-se denominar de “escola sem partido”. No Ensino Médio redundou na possibilidade dos educandos montarem um currículo, selecionando o que desejam estudar. Embora a escolha de cada disciplina não eleja nenhuma metodologia, parece algo de suprema inovação. O inovador não está no currículo, nem na metodologia fastidiosa contestada, mas na órbita vingativa de impor a mordaça ao professor.
            Esse descalabro em certas aulas ou conferências, em nome da “democracia participativa”, vai além de inibir a palavra do professor, acham que devem tirar-lhe também a mesa; aí sim ele será obrigado a igualar-se aos alunos. É certo que a mesa nunca foi sinônimo de sabedoria, ela mais serviu como instrumento de poder ou de apoio para descansar os livros, e cadernetas. Mas ela tem a simbologia coordenadora, seja no âmbito familiar, no consultório médico ou na sala de aula.
            Consideramos que o interesse pela eliminação da mesa, além dos motivos já citados favorece, em primeiro lugar, a contestação ao valor do saber ouvir e, em segundo lugar, a imposição, sobre o conhecimento, da espontaneidade do saber do Senso Comum.
O professor é a liderança do processo educativo. Uma liderança interessa-se por cada um dos membros de seu grupo. Se está bem. Se está evoluindo. Se tira notas boas, etc. Por isso, ele deve igualar-se em todos os sentidos aos seus liderados, menos nas responsabilidades que são unicamente sua e uma delas é superar o Senso Comum. É ir além da opinião do que cada um acha sobre certos aspectos. É função dele preparar a aula com conteúdo que vise elevar o nível de conhecimento e consciência.
            Nesse sentido, como o cavalo de Napoleão, a mesa é o instrumento do professor para fazer a guerra contra a ignorância, contra o autoritarismo e a lei da mordaça. Ela representa, na comparação com o âmbito familiar, com os joelhos da mãe, a quem a filho recorre quando precisa de acolhimento. Por isso, professor e professora, não deixe que lhe tirem a mesa, ela ainda é a simbologia da sua importância em sala de aula.
                                Ademar Bogo. Filósofo, escritor e agricultor. Membro da Academia Teixeirense de Letras.

           

domingo, 8 de janeiro de 2017

MENSAGEM E MENSAGEIRO



            Uma mensagem, do ponto de vista conceitual pode ser um comunicado, uma notícia ou um recado, por isso pode ser escrita ou levada verbalmente. Mensageiro então é aquele que transporta informações, muitas vezes surpreendentes, outras vezes, sem espanto, nem preparação, declara aquilo que precisa ser dito.
            Antigamente o mensageiro era de carne e osso, hoje ainda temos o carteiro que nos visita e nos entrega mensagens em forma de encomendas, ou seja, os carteiros viraram entregadores de mercadorias, as mensagens mesmo, agora são virtuais, precisa catá-las entre os anúncios e interpretá-las.
            Do ponto de vista da política, mensagens e mensageiros são cada vez mais estarrecedores. Ninguém mais se surpreende com medidas governamentais que atacam que trabalha ou vão começar a trabalhar; os que envelhecem; os aposentados; os escolarizados e aqueles que ainda vão estudar; e assim por diante.
            Na mensagem respeitosa, sempre há um cerimonial. O mensageiro se aproxima e prepara os sentimentos do destinatário. Muitas vezes informa primeiro a um membro da família mais distante, que se encarrega de ser o portador, utilizando-se sempre do preâmbulo: “você precisa ser forte!”. Do outro lado, só se ouve o silêncio. Os lábios ressecados nada falam, as mãos se juntam como se o que virá depois do revelado será uma punição. A oração, em caso de morte, é a única solução para quem não tem o que fazer, em caso de vida, é ausência de força, impotência política com poucas chances de salvação terrena.
A mensagem dos fatos produz um choque diferente, principalmente quando as autoridades dizem que “chacinas são acidentes”, como perder a direção e bater e morrer. Para o capitalista, o presidiário, a prostituta, o morador de rua, o aposentado, o professor, o pequeno agricultor, o favelado, o camelô são pessoas que não existem ou só existem para a polícia, para o juiz, para o pastor e o coveiro, por isso torcem que haja “uma chacina por semana”.
            O ano velho foi o mensageiro do ano novo. Ele anunciava, como o Deus romano, que se chamava Jano, e deu o nome ao mês de Janeiro, e, por sinal fora agraciado com duas faces: uma voltada para trás, era o passado, nunca esquecido, a outra, voltada para frente, para mostrar que a vida continuava. A nós, as duas faces se combinam. A do ano passado: do golpe e do roubo dos direitos; a do ano novo, a do golpe e a matança nos presídios e nas ruas. E olha que estamos apenas em Janeiro.
            Mas, Janeiro, pode ser a transição. É o tempo certo para fazer programas, indicar medidas e ajeitar o planejamento para as saídas. Sobre elas podemos dizer que, existem as saídas, para baixo e para o alto. A para baixo pertence aos tatus que quanto mais cavam mais se enterram e, as para o alto pertence aos felinos, buscam ultrapassar o espaço pelo teto. Para baixo é ficar no “fora Temer”, “diretas já”, e “nenhum direito a menos”; para cima é generalizar os enfrentamentos, a desobediência civil e construir a transição socialista.
            A mensagem de Jano, para o ano novo, é que você não merece ser submetido aos poderes carcomidos, viciados e vendidos ao imperialismo. Falta-nos um mensageiro partidário, há que ser construído para atacar as mensagens indigestas da classe dominante.
                                                                              Ademar Bogo, filósofo, escritor e agricultor